Mangue Bangue, Hélio Oititica
hoje acordamos cedo
mas era tarde demais
ó rapaz, estúpido rapaz!
sem amanhã de manhã, menina
não haverá felicidade
só solidão, sem rima
antitética e paradoxalmente
como escrever de novo
no jornal de ontem
é essa insensatez
que ora nos faz
e amanhã nos fez
lambuzados de mel e fel
somos um moderno barroco
uma séria brincadeira
são tantos os versos a roubar
muitas as músicas a cantar
e no céu dor a espalhar
compondo essa descanção
com fatias de medo
e vinho muito azedo
reparto em tercetas estrofes
fujo à censura, amante da arte
um semi-plágio de ene funções
quadráticas, trigonométricas
sobrejetoras ou peripatéticas
vou atrás da vida pra poder morrer
perdido no limite da criação
batendo na mão o coração
amarro palavras monograficamente
monogratifico aquela história
numa morfosintaxe frouxa e inovadora
derretida numa panela de dendê
e parece não mais haver
maneira de um fim colocar
nesse dueto minueto
não é soneto, é cianeto
é um risoto ignoto
é um poético dom patético
o poeta abandonou seu ofício?
ResponderExcluiro poeta abandona seu ofício, mas o ofício não abandona o poeta.
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