domingo, 13 de novembro de 2011

A literatura infantil ao contrário de Pascal Bruckner


Le Petit Poucet, Gustave Doré

Bienal do Livro Salvador, 2011. Num dos estandes, um sebo com preços convidativos, cujo maior concorrente era o inferno respiratório que o pequeno espaço havia se tornado, tomado por pessoas atraídas pelas pequenas cifras de três reais por exemplar, encontrei um livro que atraiu primeiramente por se destacar de brancura entre tantas páginas vizinhas amareladas, e depois pelo texto da orelha. Ignorante sobre o autor, Pascal Bruckner, filósofo francês autor de romances e ensaios, optei, pelo que mais tarde fiquei contente, pela compra.

Dois contos preenchem as 127 páginas do livro, Bichos-papões anônimos e O apagador. No primeiro, a narrativa de um jovem aristocrata, homem fino, herdeiro da antropofagia infanticida dos bichos-papões. Já no outro conto, a história de Paul Folcone, velho químico e misantropo arruinado pela alegria inocente das crianças, que resolve vingar-se delas. Assim, a obra é uma estranha mistura de realismo narrativo (linearidade, detalhe descritivo, nomes próprios, detalhes históricos para sustentar o argumento) com o surrealismo de uma figura folclórica submetida à socialização e líquidos mágicos extintor de faces infantis.

Durante a leitura, me vieram algumas interpretações a respeito do significado interior dos textos. Não que seja imprescindível a todo texto uma interpretação subjacente, mas tenho uma forte impressão de que o livro do filósofo francês pode e deve ser lido como uma alegoria. Contos de fada ao contrário, um elemento em comum nas duas narrativas é a violência contra a criança: assassinadas cruamente, transformadas em banquete, torturadas, submetidas a cativeiro, tudo escrito numa naturalidade que recorda a inocência dos contes d’enfants. Crítica a esse tipo de literatura, denúncia de eventos dessa natureza? Se deixarmos de lado a evidência da personagem infantil, o que está justamente no seu contraponto imediato, encontramos um debate da condição adulta enquanto marcada de vícios, crueldade, vazia de sentido e jugulada à fatalidade da vida.

BRUCKNER, Pascal. Bichos-papões anônimos.
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Um comentário:

  1. e assim, a palavra mais bela da língua portuguesa: promoção, e ainda, gerando boas leituras! rs

    quero novidades, meu bem.

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